O brasileiro que foi de ‘faz tudo’ a técnico recordista no basquete dos EUA

O brasileiro que foi de 'faz tudo' a técnico recordista no basquete dos EUA

ALEXANDRE ARAUJO
RIO DE JANEIRO, RJ (UOL/FOLHAPRESS) – Arthur Moreira era goleiro de futsal quando um DVD da AND1 -uma competição itinerante com elementos do “jogo de rua”- despertou nele a paixão pelo basquete. A relação com a modalidade ganhou novos capítulos. Em quadra, não tão duradouros quanto sonhava, mas soube aproveitar as oportunidades. Ele se tornou o primeiro brasileiro a ser técnico na primeira divisão universitária dos Estados Unidos, obteve números que chamam a atenção e sonha em chegar à seleção.

Outrora ‘faz tudo’ na comissão técnica, ele seguiu carreira e se tornou o treinador principal do time feminino da Universidade de Idaho. Alcançou 18 vitórias logo na primeira temporada à beira da quadra, um recorde -Tara VanDerveer era a detentora da melhor marca da universidade, com 17 no primeiro ano na primeira divisão. Posteriormente, ela comandou o time de Stanford e da seleção norte-americana.
“Eu estava muito empolgado, fiquei muito feliz. Aí voltei à Terra e me toquei que tínhamos duas jogadoras no elenco (risos). Tivemos de assinar com 12 jogadoras novas e, praticamente, montamos um time novo. Era a receita para o desastre, né? Um head coach novo, no primeiro ano, sem experiência, com um time que nunca jogou junto… Mas tivemos um grande sucesso. Foi uma honra treinar esse time e conseguir 18 vitórias seguidas. Me tornei o head coach com o maior número de vitórias em uma primeira temporada aqui em Idaho.”

Natural de Belo Horizonte, Arthur iniciou a trajetória no basquete na escolinha do Minas Tênis Clube, do qual ele e a família eram sócios -enquanto também fazia parte do time da escola. Mais alto que os meninos da mesma idade, começou a se destacar. Passou a “levar mais a sério”, como classificou, aos 15 anos, e chegou até o sub-19 do próprio Minas, quando fez parte de uma geração que contou com nomes conhecidos do público.

“Com 18 anos, passei ao sub-19 do Minas, que é um dos times, até neste domingo (20), mais talentosos que vi. Sou do mesmo ano do Raulzinho, Cristiano Felício… Era uma equipe muito forte. E ‘jogar’ estou sendo bem positivo, porque eu não saia do banco com esse tanto de craque (risos). No finalzinho dos meus 18 anos, esse pessoal começou a jogar mais no adulto e foram abrindo mais oportunidades”, lembra.

EMBARQUE PARA OS EUA
Arthur tinha o sonho de jogar basquete nos Estados Unidos, país que tem a principal liga e as grandes estrelas da modalidade. Em julho de 2010, quando estava no último ano de colégio, conseguiu, com a ajuda da família, investir e participar de um programa na Flórida. Foram 10 dias atuando em diferentes times com outros jovens. Voltou ao Brasil, mas as boas notícias não tardaram.

“Algumas universidades entraram em contato e mostraram interesse, e a Sonoma State University foi uma delas. Ela disputa a segunda divisão da Califórnia. Empacotei tudo, fiz as malas e vim em agosto de 2011. Então, estava aquela empolgação de jogar o basquete universitário nos Estados Unidos”, pontuou.

“Só que, chegando lá, não deu muito certo. No meu primeiro ano, fui cortado do time. Ainda tenho muito contato com o meu técnico da época e sempre falo que concordo 100% com a decisão dele. Eu não tinha como jogar ali naquele time”, lembra ele, com bom humor.

Arthur, porém, se manteve no programa da bolsa de estudo, mas ocupando uma nova função no basquete da universidade.

Sempre fui um cara que estava no escritório quando estava fora do treino. Ia assistir aos vídeos com os treinadores, via os jogos, discutia táticas e, às vezes, até dava uns pitacos. À época do meu corte, só tinha o técnico principal e um assistente, e o resto era tudo voluntário. Então, me mantiveram e comecei a trabalhar no backstage. Fazia de tudo: lavava a roupa do time, limpava a quadra, colocava as tabelas no lugar, completava o treino para simular jogadas… Foram três anos nessa função. No meu último ano de faculdade, sentei com o treinador e disse que queria seguir esse caminho.

Pat Fuscaldo, então, deu novas responsabilidades ao estagiário, que passou a cuidar do recrutamento de jovens e logística da equipe. Quando se formou, Arthur recebeu uma proposta para ser assistente na Universidade de São Francisco, agora para trabalhar com basquete feminino. Já na nova casa, foi quem descobriu e levou a grega Ioanna Krimili, que bateu o recorde de cestas de três e se tornou uma estrela na NCAA.

“Ela sempre fala que se não fosse por mim, não estaria aqui, mas eu falo que se não fosse por ela, eu também não estaria aqui. Todo técnico precisa de uma jogadora boa. Ela mudou a minha carreira e abriu muitas portas”, celebra.
Em 2023, o brasileiro foi para Idaho, ainda como assistente. E a chance de se tornar técnico principal aconteceu pouco antes da atual temporada.

INSPIRAÇÕES
O brasileiro revela que estuda o trabalho de diversos técnicos, e cita como um dos exemplos Tiago Splitter. Campeão da NBA como jogador, pelo San Antonio Spurs, ele atualmente é técnico do Paris Basketball, da França – que venceu o Real Madrid se classificou aos playoffs da Euroliga. Na avaliação de Arthur, o basquete europeu é mais rico em questões táticas que a liga norte-americana.
Tem vários técnicos que eu admiro. No basquete feminino, no universitário, a final da NCAA foi entre dois técnicos que fazem um trabalho espectacular. Mas boa parte da minha influência vem do basquete internacional. Assisto muito à Euroliga. Acho que a NBA é muito divertida de assistir, mas é um show à parte. É o maior nível de basquete, sem dúvida, mas, em termos de técnica e tática, é um pouco mais pobre que a Euroliga. Vi muito o [Zeljko] Obradovic, principalmente na época que estava no Fenerbahçe, tenho assistido muito o Paris, do Tiago, que está fazendo um trabalho incrível. A minha comissão fala que eu sou meio que um cientista maluco. Crio algumas táticas que o pessoal não conhece.Arthur Moreira

O “cientista maluco” também bebe da fonte de outros esportes, como o futebol e futebol americano. Ele conta que tem diversas páginas sobre os times de Pep Guardiola, atual técnico do Manchester City, da Inglaterra, e de Carlo Ancelotti, do Real Madrid, da Espanha:

“No meu drive, tenho mais de mil páginas sobre o Guardiola e o Ancelotti. Em termos de espaçamento e conceito, tem muita coisa do futebol que dá para traduzir para o basquete. Tinha um treinador de futebol americano que acabou de sair da faculdade, o Jason Eck, que também observei bastante”.

QUER CHEGAR À SELEÇÃO
Arthur elenca objetivos a curto e médio prazo, mas não esconde o desejo de, futuramente, poder treinar a seleção brasileira.

A curto prazo, meu maior objetivo é ganhar a conferência. Acho que temos condições de fazer isso. Mais para frente, sonho em tentar ganhar um título universitário aqui da NCAA. É um título nacional que é bem difícil, mas, quem sabe um dia… E o meu maior sonho de todos, desde criança, sempre foi, como jogador, jogar em uma Olimpíada. Agora, como treinador, é treinar nas Olimpíadas e conseguir uma medalha olímpica para o Brasil. Tenho muito orgulho de onde eu vim e eu quero poder competir com a seleção brasileira no futuro.

O comandante de Idaho revela que recebeu contatos de outras federações e lembrou a emoção de ouvir o hino brasileiro quando integrou a comissão técnica do sub-19, em 2023.

“Eu já até tive algumas oportunidades de treinar seleções. Como eu recrutava bastante na Europa, acabei tendo um pouco mais de contato com algumas federações de lá, e tive algumas chances, mas meu sonho sempre foi a seleção brasileira. Quando a CBB entrou em contato em 2023 para participar da comissão do sub-19, foi um grande sonho realizado. No primeiro jogo do Mundial, quando tocou o hino brasileiro, foi uma emoção que nunca tinha sentido antes. Se Deus quiser, no futuro, a gente consegue chegar lá”, disse.



Fonte ==> Gazeta do Povo e Notícias ao Minuto

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