EUA querem investigar interesse da China no agro brasileiro

Setor de carne bovina, um dos principais produtos brasileiros exportados para os Estados Unidos, está entre os que não escaparam do tarifaço no agro

O governo dos Estados Unidos quer investigar o interesse estratégico da China no setor agrícola brasileiro e os impactos de “investimentos ou do controle” chinês na cadeia de suprimentos, no mercado global e na segurança alimentar.

A informação, revelada pelo Valor Econômico, consta da proposta legislativa do Intelligence Authorization Act para o ano fiscal de 2026 – que, para o Estado americano, começa no dia 1º de outubro de 2025.

A legislação, aprovada anualmente, descreve a previsão orçamentária para os órgãos de inteligência dos Estados Unidos, como a Agência Central de Inteligência (CIA) e a Agência de Segurança Nacional (NSA). Com 280 páginas, o projeto de lei para o próximo ano cita o Brasil na seção 514 do subtítulo B, que trata especificamente da China. 

A proposta foi apresentada pelo senador republicano pelo estado do Arkansas Tom Cotton, correligionário do presidente americano, Donald Trump, no último dia 17. Na mesma data, o texto foi aprovado pela Comissão de Inteligência do Senado e encaminhado para votação no plenário da Casa.

Após analisado pelos senadores americanos, o texto segue para a Câmara dos Representantes antes de seguir para a sanção do presidente, Donald Trump. Em tese, toda a tramitação deve ser concluída em menos de dois meses, para que a nova lei possa entrar em vigor antes do dia 1.º de outubro.

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De acordo com a proposta, em até 60 dias após a promulgação da lei a diretora nacional de inteligência, Tulsi Gabbard, após consultas com o secretário de Estado, Marco Rubio, e a secretário de Agricultura, Brooke Rollins, deverá avaliar e elaborar um relatório sobre a extensão dos investimentos da China no setor agrícola do Brasil.

Conforme o texto, a investigação deve considerar: 

  • a extensão com que o ditador chinês Xi Jinping participou ou dirigiu interações com a liderança brasileira em relação ao setor agrícola brasileiro;
  • o grau de envolvimento entre o governo chinês e o setor agrícola brasileiro;
  • as intenções estratégicas, se houver, do envolvimento ou da orientação de Xi para investir no setor agrícola brasileiro;
  • o número de autoridades com sede na China ou de propriedade do governo chinês que investiram no setor agrícola do Brasil, incluindo joint ventures com empresas brasileiras; e
  • os impactos sobre a cadeia de suprimentos, o mercado global e a segurança alimentar decorrentes dos investimentos ou do controle do setor agrícola no Brasil pelo governo chinês.

Ainda de acordo com a proposta, em até 90 dias após a entrada em vigor da legislação, Gabbard deve apresentar às comissões de inteligência do Congresso o relatório detalhado com os resultados da investigação. O documento deverá ser apresentado em formato não confidencial, mas poderá incluir um anexo confidencial.

Apesar de o texto ainda poder ser modificado, a aprovação do projeto na Comissão de Inteligência do Senado, formada por nove parlamentares republicanos e oito democratas – entre eles três que assinaram uma carta questionando o tarifaço contra o Brasil –, sugere que há boas chances de a proposta passar pelo plenário da Casa com a redação atual.

Além do Brasil e da China, o projeto menciona, entre outros países estrangeiros, Rússia, Coreia do Norte, Irã, Venezuela e Cuba.

A China é o maior parceiro comercial do Brasil desde 2009. Em novembro do ano passado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) recebeu Xi Jinping no Palácio da Alvorada, para assinatura de 37 acordos de cooperação, incluindo a abertura de quatro mercados agropecuários.

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Menção ao Brasil em projeto de lei de orçamento para inteligência é inédito

Embora a NSA já tenha espionado o Brasil durante o governo DIlma Rousseff (PT), segundo relevações do site Wikileaks, em 2013, trata-se da primeira vez que o país é mencionado nesse tipo de projeto de lei. A intenção explícita do governo americano ocorre em meio a uma escalada de tensão inédita na relação entre os dois países desde a redemocratização.

Na última semana, a contenda atingiu seu auge com a confirmação, pelo presidente Trump, da tarifação adicional de 40% sobre as exportações brasileiras ao mercado americano – a maior em andamento sobre outro país –, e a aplicação da Lei Magnitsky contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

O governo americano justificou a medida com a alegação de que Moraes é responsável por “uma campanha opressiva de censura, detenções arbitrárias que violam os direitos humanos e processos politizados, inclusive contra o ex-presidente Jair Bolsonaro [PL]”. 

Antes disso, o ministro, seus familiares e outros membros da corte já haviam tido seus vistos americanos revogados, sendo impedidos de entrar nos Estados Unidos.

No dia 15, o governo Trump abriu ainda uma investigação contra o Brasil, por meio do Escritório do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR), sobre ações, políticas e práticas brasileiras consideradas “irrazoáveis” ou “discriminatórias” e que “pesam ou restringem o comércio americano”. 

A ordem para investigação chamou atenção principalmente por incluir o Pix e o comércio de produtos piratas na Rua 25 de Março, em São Paulo, mas cita ainda questões relacionadas ao desmatamento ilegal, à proteção do mercado de etanol, à corrupção, à proteção de propriedade intelectual e a tarifas preferenciais adotadas pelo Brasil no comércio com parceiros como México e Índia.

Confira a íntegra da seção que trata da investigação sobre os investimentos da China no agro do Brasil: 

SEÇÃO 514. AVALIAÇÃO E RELATÓRIO SOBRE INVESTIMENTOS DA REPÚBLICA POPULAR DA CHINA NO SETOR AGRÍCOLA DO BRASIL. 

(a) Avaliação exigida.— 

  • (1) DISPOSIÇÃO GERAL. — No prazo de até 60 dias após a data de promulgação desta Lei, o Diretor de Inteligência Nacional, em consulta com o Secretário de Estado e o Secretário de Agricultura, deverá avaliar a extensão dos investimentos da República Popular da China no setor agrícola do Brasil. 
  • (2) ASPECTOS A CONSIDERAR. — A avaliação deverá considerar os seguintes pontos: 

(b) Relatório exigido.— 

  • (1) DISPOSIÇÃO GERAL. — No prazo de até 90 dias após a data de promulgação desta Lei, o Diretor deverá apresentar aos comitês de inteligência do Congresso um relatório detalhado com os resultados da avaliação exigida pelo parágrafo (a).
  • (2) FORMATO. — O relatório exigido pelo parágrafo (1) deverá ser apresentado em formato não confidencial, mas poderá incluir um anexo confidencial. 

(c) Definição de setor agrícola. — Para os fins desta seção, o termo “setor agrícola” refere-se a qualquer infraestrutura física, produção de energia ou terra associada à produção de culturas agrícolas. 

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Fonte ==> UOL

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