Deixar de seguir um ex é imaturidade? – 09/07/2025 – Amor Crônico

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Começo te devolvendo com outra pergunta, que é provocação e também convite à implicação: você está deixando de seguir seu ex-romance por que isso faz sentido pra você, no seu processo de elaboração do fim ou por que você quer que ele sinta algo a partir do seu gesto? Quem é o protagonista deste enredo?

Toda ação tem consequências, e o outro pode receber seu movimento de forma incômoda. Mas se a reação dele ainda é sua preocupação central… talvez você só esteja repetindo o papel de quem orbita ao redor de alguém “disponível pero no mucho” que já te provocou incômodos demais ao deixar esta história em reticências…

Por que a opinião e reação deste alguém —que você supõe que vai notar e julgar o seu distanciamento online— ainda são mais importantes do que seu próprio bem-estar emocional? Por que sustentar uma conexão que mantém viva angústia que é ficar sempre à espera de um novo like, que talvez vire convite pra vinho, que quem sabe vire encontros mais engatados, que talvez virem um relacionamento? Talvez por que você ainda sustente a fantasia de que a continuidade ou a reviravolta desta história amorosa depende de você. E aqui, é preciso se dar a devida “desimportância” para conseguir ser importante para si mesmo.

É perigosa a forma como temos entendido e idealizado a tal “maturidade emocional” como se essa fosse sinônimo de passar incólume pelos posts, mensagens, olhares e memórias daquele que um dia mexeu com a gente. Como se o maduro emocional fosse aquele que não sente mais nada em relação à pessoa, simplesmente não se abala com sua presença, com notícias de seu futuro ou com as lembranças do passado juntos. Seria isso maturidade ou anestesia?

Por trás destas exigências, quem age é um superego cruel, que impõe um ideal de eu “bem-resolvido”, inabalável… inatingível. Tão inatingível quanto esse quase amor que um dia talvez será e que, por isso, te alimenta a esperança— mas também a angústia.

Maturidade emocional pra mim é a coragem de sermos honestos conosco e nos perguntarmos: me faz bem manter conexão virtual aberta ou ela só alimenta minha fantasia de retorno? Ou, pior: reforça minha sensação de insuficiência e derruba minha autoestima cada vez que vejo aquele alguém com outro alguém num programa que a gente sonhou junto?

Por que ainda quero acompanhar a vida editada dessa pessoa? Por que acho que o acesso que ela tem à minha vida igualmente editada poderia reescrever nosso final? Será que realmente faz sentido enraizar sua esperança de reaproximação no campo mais volátil, gamificado, voyeurista e egóico dos nossos tempos? Ou é só difícil aceitar que, por enquanto, acabou?

Lembro de algo que ouvi na supervisão com o psicanalista Laerte de Paula: “A fantasia de todo neurótico é ‘eu sou a causa do desejo do outro’”. Assim, se ele me deseja, preciso seguir trabalhando pra manter esse desejo. Se não me deseja, falhei. Fui intensa. Fraca. Impulsiva. No nosso caso, a fantasia seria: “Me precipitei e deixei de seguir. Agora estou sendo punida pela minha incapacidade de controlar minhas emoções… é por isso que o amor não vinga!”.

Mas a verdade é: o desejo do outro diz respeito ao outro. Não é o seu “deixar de seguir” que estraga tudo, mas o apego à ideia de que a culpa é sempre sua. À ideia de que seus incômodos não são válidos o suficiente pra desenhar um limite.

Me lembro de um trecho de Tudo é Rio de Carla Madeira que amo e que cabe aqui “Quem vê de fora faz arranjos melhores, mas é dentro, bem no lugar que a gente não vê, que o não dar conta ocupa tudo.” É de dentro que a gente sabe se não dá conta de manter esse fio virtual de esperança, de acompanhar a rotina do outro, de sentir o coração bater mais forte toda vez que ele curte um stories e apertar toda vez em que a curtida mais uma vez é só uma curtida. Maturidade emocional é honrar e validar o próprio sentimentos e em nome deles se poupar, sem se alienar ao que você supõe que seja a opinião de quem mais machuca do que conforta.

Entendo que dá medo que o outro se esqueça da gente. “Quem não é visto não é lembrado” diria minha avó. Sumir digitalmente é também correr o risco de sumir da lembrança e do desejo do outro.

Mas é, ao mesmo tempo, se dar a chance de sumir da obsessão. De se libertar das perguntas: “Será que ele viu essa foto?”, “será que esse trecho de poema foi uma indireta pra mim?”. Talvez ele, mesmo virtualmente presente, já esteja mais desconectado do que você gostaria de admitir.

Talvez reapareça só para massagear o ego, manter os encontros casuais que são uma delícia, mas não pra levar o enredo pra um romance. Você quer mesmo sustentar esse papel de solteiro bem resolvido cheio de maturidade emocional no digital enquanto suas emoções escorrem toda vez que você fecha o celular? Pra que? Pra quem?

Nesses amores de reticências, parece que deixar de seguir é colocar um ponto final. É perder de novo esse quase amor que vive se encontrando e se perdendo. É reviver a dor da impossibilidade. Concretizá-la. Mas o fato é: hoje a relação já é impossível. Por que o outro não quer. Pode ser que um dia as coisas mudem? Pode. Mas se o desejo que já foi beijo, gozo, conversas profundas, manhãs entrelaçadas precisa agora ser sustentado pelo fio virtual para que o outro talvez volte… talvez os silêncios já digam mais do que as curtidas e você esteja evitando ouvir.

Ao invés de temer o risco de passar uma mensagem errada, tenha a coragem de não passar mais mensagens. Não por revanchismo, por autocompaixão. Você não precisa deixar de seguir pra esquecer. Mas talvez precise esquecer a esperança de que seguir ainda te conecta.

E se você também tem um dilema ou uma dúvida sobre suas relações afetivas, me escreva no colunaamorcronico@amorespossiveis.love. Toda quarta-feira respondo a uma pergunta aqui.



Fonte ==> Folha SP

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